Bem-vindo (a), carinhosamente minha saudação!
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Robert Walter Weir |
É de Emile Faguet, se não me engano, o seguinte apólogo: Havia certa vez
um jovem dilacerado por uma situação afetiva crítica. Queria ele com
toda a alma sua graciosa esposa. E tributava afeto e respeito profundos à
sua própria mãe.
Ora, as relações entre nora e sogra eram tensas e, por ciumeiras, a
jovem encantadora mas má, concebera um ódio infundado contra a idosa e
veneranda matrona.
Em certo momento, a jovem colocou o marido entre a espada e a parede: ou
ele iria à casa da mãe, a mataria, e lhe traria o coração da vítima, ou
a esposa abandonaria o lar. Depois de mil hesitações, o jovem cedeu.
Matou aquela que lhe dera a vida. Arrancou-lhe do peito o coração,
embrulhou-o em um pano, e se dirigiu de volta para casa. No caminho,
aconteceu ao moço tropeçar e cair.
Ouviu ele então uma voz que, partida do coração materno, lhe perguntou cheia de desvelo e carinho: “Tu te machucaste, meu filho?”
Com este apólogo, quis o autor destacar o que o amor materno tem de mais
sublime e tocante: seu desinteresse completo, sua inteira gratuidade,
sua ilimitada capacidade de perdoar.
A mãe ama seu filho quando é bom. Não o ama, porém, só por ser bom. Ama-o ainda quando mau.
Ama-o simplesmente por ser seu filho, carne de sua carne e sangue de seu
sangue. Ama-o generosamente, e até sem nenhuma retribuição.
Ama-o no berço, quando ainda não tem capacidade de merecer o amor que lhe é dado.
Ama-o ao longo da existência, ainda que ele suba ao fastígio da
felicidade ou da glória, ou role pelos abismos do infortúnio e até do
crime. É seu filho e está tudo dito.
Este amor, altamente conforme a razão, tem nos pais, também, algo de
instintivo. E, enquanto instintivo, é análogo ao amor que a Providência
pôs até nos animais por suas crias.
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Fritz Zuber Buhler, "Com o bebê" |
Para se medir a sublimidade deste instinto, basta dizer que o mais
terno, o mais puro, o mais soberano e excelso, o mais sacral e
sacrificado dos amores que tenha existido na Terra, o amor do Filho de
Deus pelos homens, foi por Este comparado ao instinto animal.
Pouco antes de padecer e morrer, chorou Jesus sobre Jerusalém, dizendo: “Jerusalém,
Jerusalém, quantas vezes quis eu reunir os teus filhos como a galinha
recolhe os seus pintainhos debaixo das asas, e tu não o quiseste!”
Sem este amor, não há paternidade ou maternidade digna deste nome. Quem
nega este amor em sua excelsa gratuidade nega, portanto, a família.
É este amor que leva os pais a amarem seus filhos mais do que os outros —
de acordo com a lei de Deus — e a desejar para eles, com afã, uma
educação melhor, uma instrução maior, uma vida mais estável, uma
ascensão verdadeira na escala de todos os valores, inclusive os de
índole social.
Para isto, os pais trabalham, lutam e economizam. Seu instinto, sua
razão, os ditames da própria fé os levam a tal. Acumular uma herança
para ser transmitida aos filhos é desejo natural dos pais.
Negar a legitimidade desse desejo é afirmar que o pai está para seu filho como para um estranho. É arrasar a família.
E não só a família e a propriedade, como também a tradição. Com efeito,
das múltiplas formas de herança, a mais preciosa não é a do dinheiro.
A hereditariedade — o fato é de observação corrente — fixa muitas vezes
em uma mesma estirpe, seja ela nobre ou plebeia certos traços
fisionômicos e psicológicos que constituem um elo entre as gerações, a
atestar que de algum modo os ancestrais sobrevivem e se continuam em
seus descendentes.
Cabe à família, cônscia de suas peculiaridades, distilar ao longo das
gerações o estilo de educação e de vida doméstica, bem como de atuação
privada e pública, em que a riqueza originária de suas características
atinja a sua mais justa e autêntica expressão.
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"A oração da noite", Eugene Ernest Hillemacher |
Este intuito, realizado no decurso dos decênios e das centúrias, é a tradição.
Ou uma família elabora sua própria tradição como uma escola de ser, de
agir, de progredir e de servir, para o bem da pátria e da cristandade,
ou ela corre o risco de gerar, não raras vezes, desajustados, sem
definição do seu próprio eu e sem possibilidade de encaixe estável e
lógico em nenhum grupo social.
Do que vale receber dos país um rico patrimônio, se deles não se recebe —
pelo menos um estado germinativo, quando se trata de famílias novas —
uma tradição, isto é, um patrimônio moral e cultural?
Tradição, bem entendido, que não é um passado estagnado, mas é a vida que a semente recebe do fruto que a contém.
Ou seja, uma capacidade de, por sua vez, germinar, de produzir algo de
novo que não seja o contrário do antigo, mas o harmônico desenvolvimento
e enriquecimento dele.
Assim vista, a tradição se amalgama harmonicamente com a família e a
propriedade, na formação da herança e da continuidade familiar.
Este princípio está no bom senso universal. E por isto vemos casos em
que mesmo os países mais democráticos o acolhem. É que a gratidão tem
algo de hereditário.
Ela nos leva a fazer pelos descendentes de nossos benfeitores, mesmo
quando já falecidos, o que eles nos pediriam que fizéssemos. A essa lei
estão sujeitos não só os indivíduos como os Estados.
Haveria uma flagrante contradição em que um país guardasse em um museu,
por gratidão, uma caneta, os óculos, ou até os chinelos de um grande
benfeitor da pátria, mas relegasse à indiferença e ao desamparo aquilo
que ele deixou de muitíssimo mais seu que os chinelos, isto é, a
descendência.
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Frederick Morgan, "Amor materno" |
Daí a consideração que o bom senso vota aos descendentes dos grandes
homens ainda que sejam pessoas comuns. Por isto é que, por exemplo, nos
Estados Unidos, todos os descendentes de Lafayette, o militar francês
que lutou pela independência, gozam das honras da cidadania americana,
tenham eles nascido em qualquer outro país.
Daí também a pensão que governos brasileiros têm dado muito justamente a
descendentes de grandes figuras, caídos em um honrado estado de
necessidade: filhos ou netos de Campos Sales, Rui, etc.
Daí também um lance histórico dos mais belos, ocorridos durante a mais recente guerra civil espanhola.
Os comunistas se haviam apoderado do duque de Veraguas, último descendente de Cristóvão Colombo, e iam fuzilá-lo.
Todas as repúblicas da América se uniram para pedir clemência para ele. É
que não podiam elas ver, com indiferença, extinguir-se sobre a terra a
descendência do heroico descobridor.
Estas as conseqüências lógicas da existência da família e dos reflexos dela na tradição e na propriedade.
Privilégios injustos e odiosos?
Não.
Desde que se salve o princípio de que a hereditariedade não pode
acobertar o crime, nem tolher a ascensão de valores novos, trata-se
simplesmente de justiça. E da melhor...
(Autor: Plinio Corrêa de Oliveira, “Folha de S. Paulo” de 18-12-1968) Fonte-Valores inegociáveis: respeito à vida, à família e à religião
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